domingo, 8 de outubro de 2017

LAUREAR A PEVIDE | Igreja de São Francisco de Évora


Numa publicação anterior, contei-vos que me tinha apaixonado por uma cidade. Dois dias foram mais do que o suficiente para que Évora ficasse no meu coração e digo-vos, sem exagero, que é um sítio onde eu gostaria de morar. Mas não foi por isso que decidi escrever. Na verdade, gostava de partilhar convosco o mini-roteiro que percorremos naqueles dois dias, os quais não foram de intenso calor como era de esperar em finais de Agosto no Alentejo. Embora o calor não fosse algo que fizesse rebentar os termómetros, ficámos quase apenas no centro histórico da cidade, o que diz muito sobre este. Dois dias e ainda ficou muita coisa para ver. Mas vamos à vaca fria!

Ainda estávamos nós a discutir que decide visitar quando surgiu a hipótese de ir a Évora. Logo que esta veio à baila fiz questão de salientar que se fossemos a Évora tínhamos de ir à famosa Capela dos Ossos. Podia voltar à boleia para Lisboa, mas não sairia dali sem a visitar. E assim foi. Bem, a verdade é que não tive de ir para a beira da estrada pedir boleia, mas assim que tivemos oportunidade fomos à Igreja de São Francisco.

Esta igreja foi construída entre 1480 e 1510, abrangendo assim o reinado de dois monarcas, D. João II e D. Manuel respectivamente. Mas ainda antes da construção desta igreja ter sido iniciada, no seu lugar existiu o convento de São Francisco de Évora, que pertenceu à Ordem de São Francisco de Assis, fundada no século XII. Curiosamente, foi neste preciso lugar (canalizando o Professor Hermano Saraiva que há em mim) que D. Pedro I se casou com D. Constança Manuel, o mesmo D. Pedro que depois casa com D. Inês de Castro. Mas bem, não nos desviemos do caminho (especialmente porque faço isso frequentemente).

Ao longo do século XV, durante o mesmo período em que decorriam as navegações exploratórias ao largo da costa ocidental africana de onde provinham ouro, marfim e tantas outras riquezas, uma vez que a corte ainda mantinha o seu carácter itinerante, o convento beneficiou da presença do séquito de D. Afonso V (pai de D. João II) e da própria Família Real. Apesar dos votos de pobreza e sobriedade associados à ordem franciscana, o convento recebeu várias benesses por parte do monarca, pelo menos, até à perda de independência em 1580.

Portugal recupera a sua independência face a Castela e durante os séculos XVIII e XIX são adicionadas dez capelas laterais decoradas a talha dourada e magníficas de serem contempladas. Com a extinção das ordens religiosas, 1834, o convento e os dormitórios foram demolidos, restando somente a igreja. No entanto, a igreja é de uma beleza sem igual. Sempre que entro numa fico com aquela sensação claustrofóbica, o que não é de todo agradável como sabem, mas a igreja de São Francisco de Évora, cujo exterior foi recentemente restaurado, não me deu essa sensação. Muito pelo contrário. É um espaço amplo, leve e colorido (nós visitámos a igreja de manhã e a luz do sol reflectia no candelabro) que vai contrastar com a Capela dos Ossos.

A capela é construída no século XVII, tendo a ideia partido de três frades franciscanos. Enquanto uns acham a capela um sítio mórbido e querem sair de lá o mais depressa possível, eu fiquei fascinada e achei aquilo incrível. Os franciscanos construíram aquele espaço para que a fragilidade e a transitoriedade da vida humana não fosse esquecida. A capela mais do que um lugar de penitência, era um sítio para reflectir, sendo propositadamente construída na sala de reflexão dos frades. As suas paredes estão revestidas com ossos e crânios humanos provenientes dos vários cemitérios da cidade, que não só eram muitos como ocupavam muito espaço. Então, a solução encontrada foi usar as ossadas daí levantadas para decorar as paredes. Assustador? Não achei. Macabro? Um pouco. Fascinante? Sem dúvida!


1 comentário: